Todo o ser humano tem liberdade de opinião e de expressão, art.º. 19º. da declaração universal dos direitos do Homem, assim sendo, todos temos direito a não sermos incomodados nem difamados por usufruirmos dele.
Saramago, escritor, autodidacta, recebeu o prémio Camões e o prémio Nobel da literatura, único português a recebe-lo, grande pensador, alguém com uma visão própria do que o rodeia, da realidade que o envolve, que não se restringe a reproduzir, criando, alguém “que se limita a levantar uma pedra e a pôr à vista o que está por baixo, não tendo culpa se, de vez em quando lhe saem monstros”, como ele próprio refere, tem direito à sua opinião e a exprimi-la, como qualquer simples mortal. Ninguém tem dúvidas acerca da existência de monstros, todos sabemos que estes habitam nas catacumbas, lugar onde nem sempre estamos dispostos a descer.
Não posso emitir opiniões negativas sobre alguém porque tenho, na prateleira, lá de casa, uns livros dele, que nunca li mas, dos quais, não gosto da encadernação, sobre os quais alguém resolveu afirmar que são improfícuos. No entanto, os seus livros, são facilmente vendáveis.
Não posso emitir opiniões negativas sobre alguém só porque é octogenário, porque cria polémica, mexe com as mentes, critica o sistema democrático, que ninguém discute, porque afirma que temos um cérebro demasiado disciplinado, que pensa só o que é preciso pensar e que nos permitem pensar, que nos diz que se não conseguirmos viver inteiramente como pessoas, pelo menos, que não vivamos inteiramente como animais. Alguém que lembra que as palavras com facilidade mudam de opinião, como as pessoas, que a morte mata muito menos que o Homem, que se contam muitas histórias sobre Deus e a morte e, que, o sonho é tão real como o corpo que o sonha.
Não posso emitir opiniões negativas sobre alguém quando não sei, sequer, analisar se há veracidade nas suas afirmações. Quem já se preocupou em ler a Bíblia? Quem já se preocupou em analisar o poder e o império do Vaticano? Como pode então alguém duvidar que a verdade seja ofendida, todos os dias, por supostos representantes de Deus? Quem pode então duvidar que eles só tenham interesse no poder, não na salvação da nossa alma e sim no controle do nosso corpo? Como posso eu duvidar que Deus continue a descansar se permite que, em seu nome, se gastem milhões na construção de templos, qualquer lugar serve para se orar, enquanto morrem milhares de crianças? Como se pode duvidar que a bíblia seja um manual de maus costumes, um catálogo de crueldade e do pior da natureza humana se nunca o lemos? Como se pode então duvidar de quem a lê perde a fé? Como se pode então acreditar que a verdade está naquele que diz, o teólogo, que a leitura de Saramago é ingénua, ideológica e manipuladora?
O conhecimento não é estanque, nem a verdade é inquestionável. Todo aquele que disser algo e conseguir prova-lo nunca poderá ser dado como louco. Lembrem-se de Galileu que defendeu o heliocentrismo numa época em que se acreditava no geocentrismo, cegamente.
Saramago é um vigilante que encontrou na palavra a arma, para lutar contra a injustiça, ignorância e poder. Alguém que procura a verdade através da análise, da observação da experiência vivida, modificando o conhecimento manipulado à nascença.
Já fui católica praticante. Andei algum tempo levada pela multidão até que um dia…um dia parei para pensar. Afinal que me adiantava pertencer a uma religião que eu reconhecia envolta em pecado, em egoísmo e em mentira?
Não querendo de maneira nenhuma encontrar uma verdade facilmente abalável, dediquei-me à leitura da bíblia. Li a bíblia utilizada pela religião católica, pelos testemunhas de Jeová e o Livro do Mórmon, uma das quatro obras padrão da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, igreja Mórmon, uma religião cristã restauracionista.
Facilmente perdi a fé, facilmente conclui que tinha sido enganada, que o que me foi ensinado não tinha base bíblica, alguns exemplo disso são as imagens existentes nas igrejas, os templos, o negócio dentro deles e, o pagamento da bula. Se tivesse que seguir uma religião não seria a católica porque, a mesma, é a que faz uma leitura unilateral da bíblia, baseando-se mais no velho testamento, relação entre Deus e o Povo Israelita, esquecendo, por conveniência, parte do novo testamento, escrita após o nascimento de Cristo.
Tenho crenças, todos as temos, convicções baseadas nos poucos conhecimentos adquiridos. Acredito que o Homem nasce bom, que a sociedade o corrompe, Jacques Rousseau defendeu-o, que a conveniência, a vontade de seguir a facilidade, o egoísmo, o poder o corrói transformando-o em vingativo, oportunista, vigarista e interesseiro.
Um dia, numa entrevista um jornalista perguntou a Saramago:
Como podem homens sem Deus serem tão bons?
Saramago respondeu:
Como podem homens com Deus serem tão maus?
Estas questões servem apenas para concluirmos que não é Deus que distribui a bondade, que não é Deus que nos permite respeitar o próximo, as suas ideias, as suas convicções, que não é Deus que nos dá ou tira valor, que não é Deus que nos dá ou tira a capacidade de análise. Com ou sem Deus seremos aquilo que procurarmos ser.
Brown Eyes
Comentários
P.S. mais um texto maravilhoso teu
Eu estou do lado de Saramago... como estaria de qualquer pessoa que tivesse dito o que ele disse.
E preciso não esquecer que todas as religiões foram feitas com intenções positivas... mas essas intenções perdem-se pelo caminho.
Também como tu, perdi a fé... há já muitos anos. Mas cheguei a ler partes da bíblia.
Sempre achei o deus da bíblia completamente assustador.
Um deus que ama... mas que condena... que tudo perdoa, mas que atira com as almas para as chamas do inferno...
Ãh?!?
Se a sua misericórdia é infinita... há um inferno para quê?
Lembro-me de ter uns cinco anos, e numa aula de catequese, a catequista ter descrito o inferno e inclusive ter mostrado umas gravuras. Fiquei aterrorizada durante semanas!!
Um manual de maus costumes? Nem sempre... mas muitas vezes, sim.
Beijinhos*
A bíblia é muitas coisas para muitas pessoas e cabe a cada uma interpretá-la... Acho!
Saramago diz, a determinada altura, em Caim, que Deus é um Filho da p…Sou contra faltas de respeito. Não precisamos, nunca, de vulgarizar o nosso discurso. Ele acabou por concordar que se excedeu mas, o que é certo, é que o fez. Importante é que não sigamos sem saber porque o fazemos, saibamos ouvir, saibamos analisar e descobrir a estrada que nos levará ao destino que escolhemos, seja ele qual for o assunto.
Obrigado pela tua visita e pela tua opinião. Serás sempre bem-vindo neste blog mesmo que não concordes com o que aqui é dito.
O Saramago tem todo o direito de dizer o que lhe vai na cabeça, o Saramago e todos nós, porque só o facto de ser escritor e ter ganho um Nóbel, não lhe dá a ele direitos a mais do que a qualquer um de nós comuns mortais. Certo é que o Saramago mostrou que dizer o que lhe dá na gana ao mesmo tempo que lança mais um livro, também é bom para as vendas, e muito dirão ah e tal o Sr. nãp precisa disso! Se não precisa parece! Porque existem formas de diozer as coisas e ele quanto a mim utilizou a mais correcta, com isto quero eu dizer que, se eu ouvisse algum dos meus filhos referir-se a alguém, quem quer que fosse de uma forma tão azeda, imediatamente lhe diria que estavam a ser malcriados, e que deveremos pensar as palavras antes de as proferirmos, porque fora de ´nós mesmos existe uma multidão, e essa multidão, todos os outros fora de nós tb tem crenças, ou não também opiniões ou não, sobre este ou aquele assunto. Da mesma forma que me senti perplexa ao ouvir o Alberto João dizer aos jornalistas e dos jornalistas "fuck them" também estas declarações do Saramago me pareceram a pisar o risco.
E sim, eu sou católica, e estas coisas da fé constroem-se dentro de cada um, e a minha experiência não é de perda, mas apenas e só de ganho. E atenção, sou miope, mas não sou cega, tenho bem consciência de tudo o que me rodeia, dos podres e etcs e etcs, não me escondo deles, não me escondo neles, apenas aprendi a caminhar nessa fé e faço de cada dia mais uma etapa, sem culpas e sem medos.
Beijos
A sua idade, o seu intelecto e grande conhecimento sobre Bbilia, são de tal forrma fortes que os que pretenderam desmeti-lo não tiveram capacidade para isso...
Pois os factos não podem ser desmentidos.
É um grade Homem que eu admiro muito e lamento a polémica que fizeram sobre isso.
Como já te apercebeste, estou de acordo con o texto e fiquei feliz por ver a tua opinião.
Cumprimentos,
Carlos Alberto borges
http://umbreveolhar.blogs.sapo.pt
Beijinho e obrigada.
Torá ou Pentateuco, os cinco primeiros livros da Bíblia. Mas eu não li apenas estes, li-os todos.
BJS
BJS
E olha que eu até sou uma católica muito sui-generis, mas disso falaremos noutra ocasião, e mais, comungo de algumas das ideias do Saramago, no entanto pisar os outros, mesmo que com palavras, nunca foi a minha praia. No escuses at all.
Opá... eu curto o espalhafato que estas coisas causam! =D ...Para animar as hostes e assim. O país tá em estado comatoso, carago.
*
Mel gostava de te poder mandar esta resposta, como tu fazes mas, acredita que não sei se aqui é possível. Para lerem as respostas têm mesmo que passar por aqui outra vez. Vou investigar mas, creio não conseguir.
Beijinhos minha querida e obrigada.
Tens toda a razão.
Beijo,
Enfim, o que quero dizer é que muitos apontam o dedo a Saramago, a maioria, claro, crente, apenas porque o que nos ensinam enquanto crescemos nem sempre se coaduna com o que vem na Bíblia. Como a maioria dos católicos nem sequer leu a Bíblia, ficam chocados quando alguém aponta um defeito a Deus, defeito retirado da Bíblia.
Como muitos aqui expressaram, também fui religioso. Porém, com o tempo e à medida que lia autores, em defesa e em ataque à religião, comecei a afastar-me desta, sobretudo do cristianismo e todas as formas que possa assumir. Para isso, também contribui a leitura que fiz de alguns episódios da Bíblia e a própria actuação da Igreja Católica.
No fim, Deus, Bíblia e religião não passam de produtos do ser-humano e, portanto, sujeitos a falhas. Deus está longe de ser perfeito. afinal, não fomos nós feitos à sua imagem?
Obrigada pela visita e pela tua participação tão oportuna.
Gostei do teu espaço. Decerto, voltarei.
Saudações bloguísticas!
Obrigado pela visita e pelo elogio!
De qualquer forma, deixo-te aqui uma frase interessante, a meu ver, proferida por Peter Stilwell, padre teólogo e responsável pelo Departamento das Relações Ecuménicas no Patriarcado de Lisboa.
“Seria espantoso que um escritor como José Saramago, ateu professo, encontrasse algo de divino na Bíblia…”
No fundo, tudo se resume ao que dizes:
“Com ou sem Deus seremos aquilo que procurarmos ser.”
Grande verdade.
Bom fim de semana.
Esta frase daria um estudo curioso, um post muito interessante mesmo. Daria pano para mangas. Quem sabe um dia a vejamos desenvolvida. Não gosto de prometer, gosto de fazer e apresentar mas, que ela me fez pensar, fez. A ideia fica registada. Como deves já ter reparado o comportamento humano fascina-me e esta frase, esboroada pode dizer-nos muito desse comportamento. Obrigada por me teres dado esta oportunidade.
Bom fim de semana também para ti.
BJS e BFDS
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